"Temamos, portanto, que, sendo-nos deixada a
promessa de entrar no descanso de Deus, suceda parecer que algum de nós tenha
falhado", Hebreus 4.1.
"Esforcemo-nos, pois, para entrar naquele descanso,
a fim de que ninguém caia, segundo o mesmo exemplo de desobediência", Hebreus 4.11.
E como é que podemos entrar nesse descanso? Há passos que temos de dar nesse
sentido, todos eles muito simples, compreendidos dentro de um único ato de fé
e rendição pessoal a Deus.
O primeiro passo é fazer a seguinte afirmação:
"Acredito firmemente que a vida de fé oferece descanso". O povo de
Israel, em sua libertação, passou por duas experiências básicas, explicadas em Deuteronômio 5: ele nos tirou, para que pudéssemos entrar. São os dois lados da obra de
redenção operada por Deus. Tirou-nos do Egito para que pudéssemos entrar em
Canaã. Essa mesma realidade se aplica à vida do crente. Quando se deu nossa
conversão, Deus nos tirou do Egito; agora, o mesmo Deus todo-poderoso está
desejoso de nos introduzir na vida de Canaã.
Sabemos como Deus tirou os israelitas do cativeiro. Mas
eles impediram que o Senhor os conduzisse à terra prometida e por isso tiveram
que vaguear pelo deserto durante quarenta anos – o que tipifica a vida de muitos
crentes. Pela conversão, Deus os retira do cativeiro, mas eles próprios impedem
que o Senhor lhes proporcione tudo que está preparado para o crente. Então,
como entrar nesse descanso? Primeiramente é preciso conseguir fazer a seguinte
afirmação: "Creio que existe realmente um descanso, ao qual Jesus, que é
nosso Josué, pode conduzir aquele que crê". E quem quiser conhecer a
diferença que existe entre esses dois modos de vida – o modo como tem vivido
até agora e o que deseja ter - basta ver o contraste entre o deserto e Canaã.
No deserto há um vaguear constante, para diante e para
trás, durante quarenta anos; em Canaã, o descanso perfeito, na terra dada por
Deus. Vê-se a mesma diferença entre a pessoa que já entrou em Canaã e a que
ainda não deu esse passo. A vida no deserto é cheia de altos e baixos, de
muitos avanços e inúmeros retrocessos; de busca do mundo e de arrependimento e
volta; de desvios por causa das tentações, e retornos, com novo desvio depois. Em
Canaã não. Ali há uma vida de descanso porque o crente já aprendeu a confiar em Deus:
"Deus me preserva em todos os momentos, com seu grande poder".
Mas existe ainda outra diferença. A vida no deserto é
caracterizada pela pobreza, enquanto em Canaã há fartura. No deserto não havia
nada para se comer, e muitas vezes faltava água. Mas Deus, em sua graça, supriu
as necessidades do povo dando-lhe o maná e tirando água da rocha. Mas,
infelizmente, eles não se contentaram com isso, e levaram uma vida de
privações, murmurando o tempo todo. Em Canaã, porém, Deus lhes deu vinhas que
não haviam plantado. Os cereais já estavam lá, à espera deles. Era uma terra
que manava leite e mel, regada pelas chuvas do céu, cuidada pelo próprio Deus.
Faça esta afirmação hoje mesmo. Diga: "Eu creio que
existe a possibilidade dessa mudança, que posso deixar esta vida de morte
espiritual, de trevas, tristeza e lamúrias que tenho levado até agora, e entrar
numa existência em que todas as minhas necessidades são supridas, em que a
graça de Cristo me basta em todos os momentos". Faça essa afirmação hoje:
"Creio que posso viver nessa terra".
A terceira diferença: no deserto não havia vitórias.
Depois que o povo de Israel pecou, em Cades, tentaram lutar contra os inimigos
e foram derrotados. Mas assim que entraram na terra, derrotaram a todos eles.
Começando em Jericó, foram avançando de vitória em vitória. E da mesma forma
nós podemos ter vitórias todos os dias já que Deus, Cristo e o Espírito Santo
estão desejosos de dar-nos essa bênção. Isso não significa que não teremos mais
tentações; não é assim. Mas teremos um poder que nos advirá de nossa união com
Cristo, pelo qual podemos dizer: "Tudo posso naquele que me
fortalece", Fil. 4.13. "Somos mais que vencedores por meio daquele
que nos amou", Rom 8.37.
Segundo passo. Depois de afirmar: "Creio que esse
tipo de vida existe", vamos dizer também: "Mas ainda não a
alcancei". Alguns talvez digam: "Já tentei viver assim". E
outros dirão: "Nunca ouvi falar disso". E ainda outros talvez
confessem: "Houve momentos em que acreditei ter chegado a essa existência;
mas depois a perdi". Cada um tem que se colocar diante de Deus com toda
sinceridade. Então, os que ainda não gozam dessa experiência devem começar a
dizer: "Senhor, ainda não tenho essa bênção".
Por que é tão importante que se faça tal confissão? É que
alguns gostariam de entrar nessa existência de descanso aos poucos, mansa e
silenciosamente, mas não foi assim que Deus dispôs as coisas. Enquanto essas
pessoas estavam no deserto, elas tinham uma vida de pecado que não apenas
trazia tristeza a elas próprias, mas que também desonrava a Deus. E para que
avancem mais na rota da salvação é necessário convicção de pecado, e a
confissão dele.
Portanto, todo crente tem que estar disposto a reconhecer
em si tal condição. Terá que confessar: "Errei, pois não vivi da maneira
certa, e desonrei o nome de Deus. Agi como o povo de Israel. Com minha
incredulidade e desobediência, provoquei a ira de Deus. Que o Senhor tenha
misericórdia de mim". E cada um faça a Deus a seguinte confissão: "Senhor,
ainda não desfruto dessa vida. Não tenho te glorificado, pois não entrei na
terra do descanso".
Terceiro passo. Façamos o seguinte reconhecimento:
"Graças a Deus, posso gozar dessa vida". Algumas pessoas pensam da
seguinte maneira: "Eu creio que essa bênção existe, mas não é para
mim". Outros ficam constantemente a dizer: "Eu tenho um temperamento
muito instável. Minha vontade já é fraca por natureza; sou muito nervoso,
irascível. Não conseguiria viver, sempre descansando em Deus, sem me
preocupar". Não diga isso. Você só fala assim por uma razão: porque
desconhece tudo que Deus pode fazer por você. Pare de olhar só para si mesmo e
fixe os olhos em Deus. Aproprie-se dessa maravilhosa verdade: "Tirou- nos
do Egito para que pudéssemos entrar em Canaã".
O mesmo Deus que fez o povo atravessar o mar Vermelho, fê-lo
atravessar o Jordão para entrar em Canaã. O mesmo Deus que operou a conversão
em você pode proporcionar-lhe essa vida abençoada todos os dias. Exercite sua
fé, mesmo que ela seja pequena, e antes mesmo de reivindicar para si essa
bênção comece a afirmar: "Eu também posso entrar nesse descanso. Creio
nisso. Deus não deserda nenhum de seus filhos. Tudo que dá a um, dá a todos.
Acredito que essa bendita vida de descanso está à minha disposição.
Foi criada para que eu também me beneficiasse dela. Deus está pronto a
concedê-la a mim, e a efetuar essa obra em meu ser. Glória ao seu nome!"
Pense nessa pequenina palavra "mim", olhe bem para a face de Deus e
diga firmemente: "Posso receber esse tesouro inestimável, sim; apesar de
ser a pessoa mais fraca e mais indigna da terra".
O quarto passo consiste em fazer o seguinte
reconhecimento: "Por esforço próprio não poderei obter a bênção. Deus é
quem terá de conceder-me o descanso". É preciso afirmar com ousadia:
"Essa bênção se destina a mim também". Mas logo em seguida terá que,
humildemente, reconhecer: "Não posso obtê-la por mim mesmo; não posso
pegá-la para mim". Então, como conseguir a bênção? Se Deus já o levou a
uma consciência plena de que em si mesmo você não tem poder algum, glória a
ele, pois agora pode chegar-se para você e indagar: "Quer confiar em seu
Deus, e crer que ele operará isso em seu coração?" Reconheça isso de todo
o coração, e diga: "Mesmo que lance mão de todas as minhas forças, nunca
poderei arrancar de Deus esta bênção. Ele terá de concedê-la a mim".
Mas valorizemos essa nossa incapacidade. Foi Deus quem
nos tirou do Egipto; será ele quem terá de introduzir-nos na terra. O fato de
sermos incapazes de fazê-lo constitui grande bênção para nós. Ore pedindo que
Deus, pelo Espírito Santo, lhe revele o quanto é incapaz, e essa revelação
abrirá o caminho para que, pela fé, possa dizer: "Senhor, será preciso que
tu mesmo operes isso em minha vida, senão nunca receberei a bênção". E
Deus o fará.
Algumas pessoas estão sempre ouvindo mensagens sobre a
fé, sobre crer, bem como apelos insistentes para que creiam, e não entendem por
que não conseguem crer. Só existe uma resposta para isso: o ego. O ego se
esforça, luta, tenta tudo, mas acaba sempre fracassando. Mas quando chegamos ao
fim de nossa forças, e não podemos fazer mais nada a não ser clamar:
"Senhor, socorre-me", então nossa libertação está próxima.
Creia nisso. Foi Deus quem introduziu o povo na terra.
Será ele quem nos introduzirá nessa bênção.
Temos que estar dispostos a renunciar tudo para obter
esse descanso. A graça de Deus é gratuita; ela nos é concedida sem dinheiro e
sem preço. Entretanto, por outro lado, Jesus afirmou também que quem quiser a
pérola de grande preço tem que sacrificar tudo para obtê-la; tem que vender
tudo que possui. Não basta ver a beleza, o encanto e a glória desta vida que
nos é apresentada, nem quase provar o gozo e a alegria inerentes a ela. Temos
que nos tornar proprietários, donos do campo. Tanto o homem que encontrou o
campo onde havia um tesouro escondido, como o que achou a pérola de grande
preço ficaram muito contentes, mas ainda não eram donos delas. Só se tornaram
proprietários depois que abriram mão de tudo, e compraram um o terreno e o
outro a pérola.
São muitas as coisas que temos de renunciar: o mundo,
seus prazeres, seu aplauso, sua opinião a nosso respeito. Nosso relacionamento com
ele terá de ser igual ao que Jesus manteve. O mundo rejeitou a Cristo e o
expulsou de seu meio. E nós temos que assumir a mesma posição tomada pelo
Senhor a quem pertencemos, e seguir o Cristo rejeitado pelo mundo. Temos que
renunciar a todas as nossas qualidades e virtudes pessoais, e nos humilhar até
o pó. E isso ainda não é tudo. Temos que renunciar também às nossas
experiências religiosas de antes. Temos que vir a ser nada, para que só Deus
receba toda a glória.
Quando você se converteu, Deus o tirou do Egipto; deu-lhe
a própria vida divina. Mas com sua desobediência e incredulidade, você a maculou.
Renuncie a tudo isso. Renuncie à sua própria sabedoria, às idéias que tem
acerca da obra de Deus. Como é difícil para um pregador do evangelho renunciar
à sua própria sabedoria, depositá-la inteiramente aos pés de Jesus, tornando-se
um indouto, e dizer: "Senhor, na verdade não sei nada do que deveria
saber. Tenho pregado o evangelho, mas como conheço mal a glória desta bendita
terra, desta maravilhosa vida". Por que será que o Espírito Santo não pode ensinar-nos
com mais eficácia as coisas de Deus? Só existe uma razão: a sabedoria humana
impede. A sabedoria do homem impede que a luz de Deus brilhe sobre ele.
Renunciemos a tudo.
Alguns talvez tenham que renunciar a um pecado. Pode ser
que um crente esteja com raiva de um irmão, ou uma irmã tenha brigado com a
vizinha. Ou talvez pessoas amigas não estejam vivendo como deveriam. Ou é
possível também que alguém esteja mantendo uma prática ou atitude duvidosa, sem
querer renunciar a ela e às concupiscências próprias do deserto. Dê este passo
e diga: "Estou disposto a renunciar a tudo para obter esta pérola de
grande preço; vou renunciar ao meu negócio, ao controle do meu tempo, às coisas
que dou atenção. Tudo isso ficará subordinado ao descanso de Deus, que ocupará
o primeiro lugar em minha vida. Renuncio a tudo, em troca de uma comunhão
perfeita com Deus".
Não podemos entrar nesse descanso, que é caracterizado
por uma comunhão perfeita com Deus diariamente, sem dedicar tempo ao Senhor.
Dedicamos tempo a tudo. E será que achamos que a religião é algo menor, e que podemos gozar de uma íntima comunhão com
Deus sem dedicar tempo a ele? Não, não podemos, mas a pérola de grande preço
vale tudo. Deus vale qualquer sacrifício. Cristo é merecedor de tudo.
Resolva-se ainda hoje a tomar essa decisão: "Senhor, quero ter essa vida.
Ajude- me, custe o que custar". Mas se tiver dificuldade em dizer isso,
sentindo que seu coração está em luta, não se preocupe. Diga a Deus:
"Senhor, pensei que estava disposto a tomar a decisão, mas agora vejo que
ainda tenho certa relutância. Vem revelar o mal que ainda se encontra em meu
coração". E você pode ter certeza de que, se assentar aos pés do Senhor e
confiar nele, pela sua graça, receberá a libertação.
O quinto passo consiste em afirmar: "Entrego-me
agora ao santo e eterno Deus, para que ele me guie ao perfeito descanso".
Temos que aprender a encontrar-nos com Deus face a face. Os pecados que cometemos
são contra Deus. Quando David pecou, reconheceu isso e disse: "Pequei
contra ti, contra ti somente" (Sl 51.4). A pessoa com quem vamos ter que
nos haver pessoalmente, no dia do juízo final, será Deus. E foi o próprio Deus,
em pessoa, quem perdoou nossos pecados. Então, coloque-se nas mãos do Deus vivo
hoje mesmo. Ele é amor, e está perto de nós. Está esperando para dar-lhe essa
bênção. O coração de Deus está ansioso para abençoá-lo. O coração de Deus
anseia por você. E diz: "Meu filho, você acha que está desejando esse
descanso. Na verdade, sou eu quem está desejando ter você comigo, pois quero
descansar em seu coração, habitar nele, fazer dele o meu templo".
Você precisa de Deus, é fato. Mas Deus precisa de você
também, para gozar toda a satisfação que pode ter seu coração paterno. Então
decida-se hoje e diga: "Entrego-me agora a Cristo. Já tomei a decisão, e
afirmo de livre e espontânea vontade: Senhor Deus, quero comprar a pérola de
grande preço. Renuncio a tudo por ela. Em nome de Jesus, aceito essa vida de
perfeito descanso".
E aqui o último ponto. Depois de apropriar-se da bênção,
diga o seguinte: "Agora confio em que Deus realizará tudo isso na prática.
Viva eu mais um ano ou outros trinta, hoje tornou-se novamente real para mim
essa grande verdade: “Deus é Jeová, o grande Eu Sou de eterno futuro, o eterno
Deus único. E daqui a trinta anos tudo será para ele como se fosse agora”. E
creio que esse Deus se dá a mim também, não porque haja em mim algum poder, mas
em virtude da capacidade de seu imensurável amor de preservar consigo".
Confie em Deus agora também com relação ao seu futuro.
Olhe para ele mais uma vez, por intermédio de Jesus. Quantas vezes já
reafirmamos ou ouvimos alguém repetir essa maravilhosa verdade: "Deus nos
deu seu Filho". Por que não reafirmar agora a conclusão do pensamento
bíblico: "Como não nos dará com ele todas as coisas, em todos os momentos,
todos os dias de nossa vida?" Pela fé diga: "Por que Deus não
desejaria manter-me sempre na luz de sua presença? Não foi ele mesmo quem criou
o sol que brilha tão intensamente? E a luz não está sempre penetrando em todos
os lugares? Assim sendo, será que nosso Deus, que é amor, não estaria desejoso
de brilhar constantemente, de manhã até a noite, de uma ano a outro, no meu coração?"
Deus é amor e está ansioso para se dar a nós. Até aqui você tem vivido por suas próprias forças. Não
quer começar hoje uma vida diferente? Não prefere ter uma existência em que
Deus seja tudo, confiando nele com relação a todas as coisas? Não prefere poder
dizer ao Senhor: "Ó Deus, peço-te essa vida; espero tê-la; creio que me
darás essa bênção. Hoje decido entrar nesse descanso – deixar que cuides de mim
daqui por diante, o tempo todo. Entro hoje no descanso de Deus". Tenha ânimo;
não tema nada; pode confiar em Deus. Ele o introduzirá nesse descanso.
Vejamos mais uma vez a palavra que Deus nos envia através
de seu profeta: "Acautela-te e aquieta-te; não temas, nem se desanime o
teu coração". Josué conduziu o povo na sua entrada na terra de Canaã; ou
melhor, Deus o fez por intermédio dele. E Jesus, aquele que os purificou com
seu sangue e que aprendemos a conhecer como nosso precioso Salvador é o nosso
Josué. Confie nele hoje mais uma vez e diga-lhe: "Ó meu Josué, toma minha
vida; introduz-me na terra, e confiarei em ti, e no Pai". E pode estar
certo de que ele o fará. Ele o aceitará e realizará essa obra na sua vida
ANDREW MURRAY
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