A Divindade de Cristo: Verdade que Não Precisou de Voto
Quando ouvimos dizer que Constantino “inventou” a divindade de Jesus no Concílio de Nicéia, parece que a história virou do avesso. Afinal, se algo foi confessado, cantado, pregado e sofrido por testemunhas oculares muito antes de qualquer imperador aparecer, não se trata de invenção, mas de revelação. Pegue uma xícara de café e vamos percorrer essa trilha de palavras que começa nos dias de Jesus e chega até nós sem desviar um milímetro.
A primeira vez que alguém chamou Jesus de “Deus” foi, ironicamente, justo depois de tudo terminar. Tomé, o cético de plantão, encostou os dedos nas feridas do Mestre ressuscitado e desabafou: “Meu Senhor e meu Deus!”. Jesus não corrigiu. Aceitou a adoração como quem recebe o que lhe pertence desde sempre.
Esse grito de Tomé ecoou. Paulo, antes tarde do que nunca, voltou-se para as sinagogas romanas e disse que o Messias “é sobre todas as coisas, Deus bendito para todo o sempre” (Rm 9.5). Em cartas rápidas e sem floreios, ele chama a Cristo de “nosso grande Deus e Salvador” (Tt 2.13). Pedro e João não ficaram atrás: “Acreditais em Deus — crede também em mim”, dizia Jesus. E João, que ouviu de perto, escreveu: “No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus.” A frase é curta, mas balança qualquer estrutura: se tudo foi feito “por” ele, ele não pode ser parte da lista de coisas feitas.
O Novo Testamento inteiro reforça esse tom. Abra Hebreus 1 e lá está: “Ó Deus, o teu trono subsiste para todo o sempre.” Colossenses 1 acrescenta: “Todas as coisas subsistem por ele.” Não é linguagem poética; é afirmação de direitos divinos. O Cristo que os discípulos conheceram não era um guru iluminado, mas o Criador do cosmos — o Kosmokrator — e ao mesmo tempo o Pantokrator, aquele que mantém o universo funcionando a cada segundo.
Agora, dê o salto de quase três séculos. Enquanto Roma ainda queimava cristãos à luz do dia, bispos e teólogos repetiam o que já estava escrito. Inácio de Antioquia, aluno do próprio João, escreve por volta de 105 d.C.: “Jesus Cristo, o nosso Deus.” Clemente, poucas décadas depois, diz ser “apropriado pensar em Jesus Cristo como se fosse Deus”. Irineu, Tertuliano, Orígenes, Lactâncio — cada um no seu canto do Império — não titubeiam: Cristo é Deus. Nenhum deles recebeu telegrama de Constantino; aliás, nenhum deles sequer conheceu Constantino. Quando o imperador nasceu, em 272 d.C., a confissão já rodava há quase dois séculos.
Chegamos então a Nicéia, em 325 d.C. O que se discutiu lá? Arianus, um presbítero astuto, propôs que o Filho era “semelhante” ao Pai, mas não “da mesma substância”. Três centenas e dezoito bispos compareceram. Três centenas e dezesseis disseram não. Dois titubearam. O Credo saiu com a palavra homoousios — “consubstancial”. Não foi votação para criar divindade; foi verificação para preservar a fé entregue uma vez por todas aos santos.
Hoje, quando alguém brande o argumento da “serpente” e insinua corrupção em João 1.3, basta lembrar: o papiro P75, copiado por volta de 175 d.C., já trazia o texto exatamente como o lemos. E os pais da Igreja — todos os citados acima — o citavam sem pestanejar. Não há lacuna histórica, não há intervalo de silêncio. A linha é contínua: Tomé, João, Paulo, Inácio, Clemente, Irineu… até nós.
Portanto, Cristo não se tornou Deus numa sala de concílio. Ele sempre foi. O que Nicéia fez foi simplesmente estampar em latim e grego o que cristãos cantavam em coro desde o momento em que a pedra rolou do túmulo: “Jesus é Senhor.” A revelação não precisou de invenção; precisou apenas de coragem para ser repetida — coragem que muitos pagaram com a própria vida, muito antes de Constantino sonhar em mandar convocar bispos.
Texto base escrito por C. J. Jacinto.
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