Persistência na Oração
Andrew Murray
“Eu lhes digo: Embora ele não se levante para dar-lhe o pão por ser seu amigo, por causa da importunação [persistência] se levantará e lhe dará tudo o que precisar” (Lc 11.8).
“Então Jesus contou aos seus discípulos uma parábola, para mostrar-lhes que
deviam orar sempre e nunca desanimar. [...] Ouçam o que diz o juiz injusto.
Acaso Deus não fará justiça aos seus escolhidos, que clamam a ele dia e noite?
Continuará fazendo-os esperar? Eu lhes digo: Ele lhes fará justiça, e depressa”
(Lc 18.1,6-8).
Nosso Senhor considerou de tamanha importância que soubéssemos da necessidade
de perseverança e importunação na oração que contou duas parábolas para esse
fim. Isso é prova suficiente de que temos nesse aspecto da oração, ao mesmo
tempo, sua maior dificuldade e seu maior potencial. Jesus queria que
entendêssemos que nem tudo na oração seria fácil e tranqüilo; devemos esperar
dificuldades que só podem ser superadas através de perseverança persistente e
determinada.
Nas parábolas o Senhor mostra as dificuldades como se existissem do lado das
pessoas a quem se faziam as petições; a importunação, portanto, era necessária
para vencer a relutância delas em ouvir. Entretanto, nas nossas orações a Deus, a
dificuldade não está do lado dele e, sim, do nosso. Na primeira parábola Jesus
nos afirma que o Pai está mais disposto a dar boas coisas àqueles que lhe pedem
do que qualquer pai terreno em dar pão para seu filho (Lc 11.11-13).
Na segunda parábola, Jesus nos assegura que Deus anseia por fazer justiça
prontamente aos seus escolhidos. Portanto a necessidade de oração urgente não
pode ser porque Deus precisa ser convencido ou tornar-se mais disposto a
abençoar. A necessidade encontra-se inteiramente em nós mesmos. Porém, como não
era possível achar um pai amoroso ou um amigo disposto que pudesse servir para
ensinar a lição indispensável de importunação, Jesus recorreu à ilustração de
um amigo indisposto e de um juiz injusto para nutrir em nós a fé de que a
perseverança pode vencer qualquer obstáculo.
A Raiz da Dificuldade em Nós
A dificuldade não está no amor ou no poder de Deus, mas em nós mesmos e na
nossa própria incapacidade de receber a bênção. Ao mesmo tempo, como existe
essa dificuldade com nossa falta de preparo espiritual, há uma dificuldade do
lado de Deus também. Sua sabedoria, sua justiça e seu amor não ousam nos dar
aquilo que nos faria mal, caso o recebêssemos de forma muito rápida ou muito
fácil. O pecado, ou a conseqüência do pecado, que impede Deus de nos dar as
coisas imediatamente é, ao mesmo tempo, uma dificuldade do lado de Deus e do
nosso também. A necessidade de romper a barreira e o poder do pecado em nós
mesmos ou naqueles por quem oramos é o que transforma a oração numa luta e
peleja tão intensa e real.
Em todas as épocas, os homens têm orado sentindo a existência de barreiras
reais no mundo espiritual que precisavam ser vencidas. Suplicavam a Deus para
que removesse os obstáculos desconhecidos. Através de tais súplicas
persistentes, eram conduzidos a um estado de pleno quebrantamento e impotência,
de total entrega a Deus, de união com a sua vontade e de fé viva que movia o
seu coração. As barreiras em suas vidas e nos lugares celestiais eram vencidas
ao mesmo tempo. À medida que Deus os conquistava, eles conquistavam Deus. À
medida que Deus prevalece sobre nós, nós prevalecemos com Deus.
Se pudéssemos vir a entender que essa aparente dificuldade é uma necessidade
divina e, na própria essência das coisas, uma fonte de bênção incalculável,
teríamos muito mais disposição e alegria de coração para nos dedicarmos à
persistência na oração. A dificuldade que o chamado à importunação coloca no
nosso caminho é um dos nossos maiores privilégios.
Na vida natural, as dificuldades chamam para fora e desenvolvem as potencialidades
humanas como nenhum outro processo ou fator consegue. A educação, por exemplo,
nada mais é do que o desenvolvimento diário da mente, disciplinando-a através
do desafio de novas dificuldades apresentadas ao aluno, que ele precisa
superar. No instante em que uma lição ficou fácil para ele, é necessário que
avance para uma que seja mais elevada, com maior grau de dificuldade. É quando
encontramos obstáculos e os superamos que nossas realizações mais valiosas são
produzidas.
Na comunicação com Deus, não é diferente. Se o filho de Deus só precisa
ajoelhar-se, fazer um pedido e levantar-se com a resposta na mão, que prejuízo
incalculável resultaria à vida espiritual! A dificuldade e a demora que
requerem oração persistente é que são responsáveis pela verdadeira riqueza e
bem-aventurança da vida celestial. É ali que descobrimos quão pouco prazer
temos na comunhão com Deus e a pobreza da nossa fé nele. Percebemos como nosso
coração ainda está preso à terra, insensível espiritualmente, quase destituído
do Espírito Santo de Deus.
Somos confrontados com nossa própria fraqueza e indignidade e aprendemos a
permitir que o Espírito de Deus ore através de nós. Começamos a tomar o nosso
lugar em Cristo Jesus
e a permanecer nele, como nossa única súplica ao Pai. É lá que nossa vontade
própria, nossa força e nossa bondade são crucificadas. Lá também somos
ressuscitados em Cristo para novidade de vida, toda nossa vontade dependendo de
Deus e focada em sua glória. Louvemos a Deus, portanto, pelas dificuldades e
pela necessidade de oração importunadora como um dos meios preferidos de Deus
para nos conduzir à graça.
Pense por um pouco no que o próprio Senhor Jesus recebeu através das
dificuldades que encontrou no seu caminho. No Getsêmani, parecia que o Pai não
o queria ouvir; ele, então, orou com mais intensidade, até que foi ouvido (Hb
5.7). No caminho vivo que abriu para nós, ele aprendeu a obediência através das
coisas que sofreu e, dessa forma, foi aperfeiçoado (Hb 5.8,9). Sua vontade foi
entregue a Deus, sua fé em Deus, provada e fortalecida, o príncipe deste mundo,
com todas suas tentações, vencido.
É este o novo e vivo caminho que ele consagrou para nós. É na oração
persistente que andamos com Jesus e tornamo-nos participantes do seu próprio
espírito. Oração é um dos meios para sermos crucificados, sendo participantes
da cruz de Cristo, entregando nossa carne à morte. Ó cristãos, não nos
envergonhamos da nossa relutância em sacrificar a carne, a vontade e o mundo,
para nos dedicarmos à oração persistente? Não devemos aprender a lição que
tanto a natureza quanto Jesus querem nos ensinar? A dificuldade da oração
importunadora é o mais alto privilégio que podemos ter. As dificuldades a serem
superadas nela são responsáveis pelas mais ricas bênçãos.
Extraído de “The Ministry of Intercession” (O Ministério da Intercessão), de
Andrew Murray.
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